Introdução
O Dia do Orgulho LGBTQIAP+ , 28 de junho, no mês do orgulho, foi determinado em função da Rebelião de Stonewall, que ocorreu em 1969, quando frequentadores do bar Stonewall Inn, em Nova Iorque, que era um dos poucos lugares seguros para a comunidade LGBTQIAP+, enfrentaram a violência policial. Dentre as pessoas exaltadas neste dia temos as pessoas transgênero.
Pessoas transgênero são indivíduos que não se identificam com o gênero, seja feminino ou masculino, o qual foram designadas socialmente após seu nascimento, de forma geral, associado ao sexo biológico. Portanto, trata-se de pessoas não binárias, homens trans, mulheres trans, dentre outras identidades de gênero. Alguns nomes importantes de pessoas trans na ciência são Vivian Miranda, Gabrielle Weber, Ben Barres e Allan Hart.
Visando trazer maior visibilidade e senso sobre o assunto, neste texto será abordado um pouco sobre o que é o tratamento hormonal, além de alguns fatos e curiosidades.
O Tratamento Hormonal
O Tratamento Hormonal trata-se de um recurso clínico em que um médico prescreve a administração de hormônios principalmente via oral ou injeção, que pode trazer resultados dentro de alguns meses até 2 anos, e tem por objetivo alterar a proporção dos hormônios sexuais no corpo da pessoa trans para adequar as características secundárias daquele paciente às de sua identidade de gênero, ou seja, dependendo do gênero, promover o crescimento de mamas, redistribuição de gordura, alteração nos pêlos, alteração na voz, dentre outros efeitos, e outros procedimentos que podem ser utilizados são cirurgias nos seios, aparelho genital e treinamento vocal.
Do ponto de vista da bioquímica, pode-se dividir o tema em duas principais incógnitas, como e porquê essas alterações ocorrem com a hormonioterapia.
Bom, no caso do objetivo ser o gênero feminino o mais comum é seguir pelo caminho de utilizar hormônios estrógenos, que estimulam as características femininas, como o próprio estrogênio, nesse caso também são usados hormônios antiandrógenos, que inibem as características masculinas, nos tecidos-alvo do corpo, seja na produção de andrógenos, competindo pelos receptores celulares ou impedindo a conversão de testosterona em di-hidrotestosterona, conhecido como DHT. Este último processo ocorre inibindo a 5α-redutase, que é a enzima responsável por realizar a ligação do DHT nos receptores e assim impedindo a conversão do DHT em testosterona.
Uma observação importante trata-se de o mais comum ser utilizar hormônios relacionados com o estradiol do que a progesterona porque ela aumenta o risco de trombose e também pode inibir a ação do estrogênio, causando efeito reverso.
Já no caso do objetivo ser o gênero masculino a terapia hormonal busca reduzir o nível hormonal endógeno e manter níveis hormonais compatíveis com o gênero masculino ou se necessário, utilizar hormônios andrógenos, como principalmente a testosterona. Caso o uso da testosterona não seja suficiente para cessar os ciclos menstruais, níveis de estradiol são considerados seguros para auxiliar nesse objetivo e em raros casos é necessária a administração concomitante de progesterona, que nesse caso merece atenção somente por conta de gerar possíveis problemas de saúde e não efeito reverso, como para mulheres trans, aqui ele é usado exatamente nesse objetivo.
O tratamento de transição de ambos os gêneros, também pode incluir o uso de goserelina ou leuprorrelina, que são bloqueadores de hormônios que tem menos efeitos colaterais, suas moléculas são orgânicas, grandes e bastante complexas, como todo hormônio. A título de entendimento, ambas têm 59 carbonos e 84 hidrogênios em sua estrutura, além de nitrogênios e oxigênios.
De forma geral, todos os indivíduos produzem hormônios andrógenos e endógenos, portanto durante a terapia hormonal, o médico vai realizar exames e dosar os hormônios a serem usados para modificar a quantidade e proporção desses dois tipos de hormônios no corpo do paciente de acordo com a necessidade e objetivo. E estes que eu citei são os hormônios e tratamentos mais comuns, mas há outros mais específicos.
Vale ressaltar que o acesso da terapia hormonal pelo SUS, uma conquista relativamente recente (2008), foi introduzido, dando acesso a procedimentos como hormonização, cirurgias de modificação corporal e genital, juntamente com acompanhamento multiprofissional. Mas foi só com a Portaria 2803/2013, que o programa foi redefinido e expandido para incluir homens trans e travestis. No entanto, apesar desses avanços, a implementação do programa continua enfrentando desafios, que acabam por restringir o acesso.
É extremamente importante reforçar que as terapias hormonais devem ser feitas apenas de acordo com recomendação e prescrição médica, já que se feita de forma inadequada pode gerar sérios problemas de saúde, um deles é o câncer de mama. Qualquer pessoa, seja de quaisquer sexo, incluindo pessoas cis e trans, não-binárias, intersexo, está propensa a essa doença e o uso incorreto de hormônios aumenta as chances de ocorrer.
No caso de mulheres trans que tenham realizado hormonioterapia por 5 anos ou mais recomenda-se mamografia após os 50 anos. E no caso de homens trans há o complicador da disforia, do incômodo com o corpo e a falta de informação voltada para esse público e a transfobia institucionalizada nos aparelhos de saúde, sejam públicos ou privados. É essencial realizar o acompanhamento para evitar descobrir tardiamente a doença.
Outro ponto importante é o fato de que a terapia hormonal pode causar efeitos adversos além dos desejados. O principal efeito adverso é a ocorrência de eventos tromboembólicos, incluindo casos de trombose e embolia pulmonar, principalmente causados pelo etinilestradiol, que é um estrogênio bioativo, é um fenol e dentre seus grupos funcionais há etinil e metil, seu nome da IUPAC é 17α-etinil-1,3,5(10)-estratrieno-3,17β-diol e é um derivado do 17β-estradiol, conhecido como E2, que é o principal estrogênio endógeno nos seres humanos, ou seja, que atua no desenvolvimento feminino interno, muitas vezes utilizado em anticoncepcionais.
Problemática ambiental do uso de hormônios
O conhecimento científico-instrumental para pesquisa vem se ampliando ao longo do tempo. Atualmente é possível fazer análises de substâncias e compostos químicos que não eram sequer detectados no passado. Dentre os contaminantes desse tipo, que começam a se tornar preocupação ao serem encontrados na água, estão os interferentes endócrinos (especialmente os hormônios sexuais femininos), de origem natural (produzidos pelo organismo animal) ou sintética, para fins terapêuticos na saúde humana ou animal, como reposição hormonal ou método contraceptivo (anticoncepcionais).
Essa preocupação se deve pois nem sempre os processos de depuração de esgoto, diluição dos poluentes e de purificação da água conseguem eliminar os resíduos de hormônios. Quantidades significativas ficam sem remoção nas estações de tratamento e posteriormente são despejadas em águas superficiais.
Tratando especificamente de anticoncepcionais, embora sua concentração seja baixa e boa parte desses contaminantes seja biologicamente degradado na natureza, a presença desse hormônio sintético na água aumentou quantitativamente, posto que é excretado pela urina e lançado na rede de esgoto, a qual vai desembocar em rios e oceanos. Os efeitos de sua presença nos recursos hídricos passam a ser estudados, como a feminilização de peixes machos e outras alterações no funcionamento biológico de seres vivos.
Espécies vegetais com potencial para serem utilizadas na hormonização de pessoas Trans
Para fins informativos vale citar o estudo realizado por Daniela Tremea Casali, de título idêntico a este tópico.
O estudo em questão visa compreender plantas bioativas que influenciam o sistema hormonal, responsável pelas características sexuais secundárias, emerge como uma alternativa autônoma, acessível e de baixo custo para a hormonização da população trans. A partir dessa premissa, foi realizada uma revisão bibliográfica abrangente de estudos etnobotânicos utilizando diversas bases de dados renomadas, como PubMed Central, Portal de Periódicos CAPES, Scielo, Web of Science, SABI/UFRGS e Google Acadêmico.
Os estudos selecionados buscavam identificar espécies vegetais indicadas para diversas condições hormonais e de saúde, como hormônios, saúde da mulher/homem, menopausa, TPM, afrodisíacos, fortalecimento capilar, e regulação da menstruação. Entre as espécies identificadas, foram priorizadas aquelas mencionadas em múltiplos trabalhos etnobotânicos, seguidas de uma busca por estudos que investigaram seus constituintes químicos e atividades biológicas relacionadas às propriedades hormonais.
Entre as plantas estudadas, destacam-se Calendula officinalis, Maytenus ilicifolia, Morus alba, Morus nigra, Persea americana, Petroselinum crispum, Punica granatum, Tanacetum parthenium e Vitis vinifera, que apresentaram resultados promissores para a hormonização direta, atuando como fitoestrógenos. Além destas, Calendula officinalis, Morus alba, Morus nigra, Petroselinum crispum, Rosmarinus officinalis, Ruta chalepensis, Salvia officinalis e Vitis vinifera demonstraram potencial para ação indireta sobre o eixo hipotálamo/hipófise/gônada, sugerindo propriedades antiandrogênicas.
É importante notar que apenas quatro das dezesseis espécies selecionadas são nativas da região, como Aristolochia triangularis, Elephantopus mollis, Luehea divaricata e Maytenus ilicifolia, sendo que, destas, M. ilicifolia possui um número limitado de estudos disponíveis. Em contraste, as espécies exóticas possuem uma bibliografia mais extensa. Observa-se também lacunas significativas nesta área de pesquisa, incluindo a escassez de estudos sobre plantas nativas, a falta de pesquisa em fitoandrógenos e a ausência de trabalhos focados especificamente nas necessidades de saúde da população trans* utilizando plantas bioativas.
Esses achados destacam a necessidade de ampliar o escopo de investigação em plantas medicinais bioativas, especialmente no contexto da terapia hormonal para a saúde transgênero, visando oferecer alternativas seguras, eficazes e culturalmente relevantes.
É importante reforçar que não é indicada a automedicação com qualquer uma dessas plantas. Torna-se necessária a procura de um médico para confirmar a possibilidade de seguir por essa linha de tratamento, pois mesmo sendo de origem natural torna-se indispensável o acompanhamento profissional.